Epal é arrogante como os monopólios

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A arrastar-se nos velhos vícios, a Epal é um anacronismo da era de José Eduardo dos Santos e um gigante desmazelado

A questão do abastecimento de água à população já foi definida por José Eduardo dos Santos, nos idos anos 80, como “um problema político”, tal era, já naquela altura, a dimensão da penúria provocada pela degradação da rede de distribuição e a ausência de investimentos.

Apesar dos progressos registados nos últimos 15 anos, com a aplicação de programas institucionais como o “Água para todos”, em 2016, o acesso à água potável era uma luxo para 71,8 por cento da população angolana, de acordo com dados divulgados em Março último pela organização não-governamental WaterAid.

A República Democrática do Congo, um país enorme e afectado por instabilidade e violência crónicas, ocupa uma posição melhor que a angolana no domínio do acesso à água potável, no ano passado ali disponível para 68,8 por cento da população.

A organização considerou com a divulgação destes números que, depois de anos de guerra, Angola mostrou sinais de crescimento económico real nas últimas duas décadas, mas, fruto das más infra-estruturas e da falta de priorização e investimento por parte do Governo, “está no topo da lista dos países com maiores percentagens de população rural sem acesso a água potável”.

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Apesar da propaganda, a Epal representa hoje exactamente os velhos paradigmas de um nepotismo expirado

O país prevê concluir, este ano, investimentos de 5,95 mil milhões de dólares em projectos em curso destinados a melhorar a rede de água do país, consubstanciados na preservação, tratamento e a distribuição do produto a cada vez mais pessoas.

Uma lista curta inclui “Água Para Todos”, em curso desde 2007 para captação e fornecimento de água nas aldeias e municípios, e, a nível de Luanda, o 700 mil ligações domiciliares, precariamente cumprido desde que a empresa pública que é a concessionária do sector, a Epal, é dirigida por Leonídio Ceita, um aparentado da esposa de José Eduardo dos Santos.

Nos últimos meses, a companhia adoptou um esquema de cortes no fornecimento mais próximo de uma gestão de nada, do que um programa de abastecimento, o que não se explica depois de todo o dinheiro empregue pelo Estado.

Ou então se explica por, em Março, quando a WaterAid divulgou as vergonhosas estatísticas sobre o acesso à água potável em Angola, Leonídio Ceita estar a inaugurar um portentoso edifício como sede da Epal, onde foram investidos sete milhões de dólares em dinheiro que seria muito mais útil se usado na ampliação da rede e aumento das ligações domiciliares.

Há mais cortes que fornecimentos e o abastecimento é dominado pela compra de água em camiões cisterna, em reservatórios de plástico e em bidões, como se abastecem as populações por ordem das suas posses financeiras.

Os consumidores estão furiosos: no auge de uma campanha de cobrança de consumo – certamente para amparar gastos com a inauguração do edifício em que está instalada a sede –, alguns deles contaram nas redes sociais como se contiveram para não soltar os cães contra os funcionários da Epal encarregues de importunar o público com a leitura de contadores e a ameaça de cortes.

Com tão elevados índices de rejeição pública, a Epal apresenta-se, hoje, como uma empresa que representa exactamente os velhos paradigmas, um perfil caracterizado por um nepotismo expirado, ao invés da competência; pelo monopólio, apesar de uma procura crescente e insaciada; e pela arrogância e a opacidade características dos monopólios, pese embora a flagrante aspiração pública pela transparência.

A arrastar-se nos velhos vícios, a Epal é, hoje, um anacronismo da era de José Eduardo dos Santos, um gigante desmazelado que não se vai adaptar ao projecto de sociedade que João Lourenço, o novo Presidente, se propõe instituir.

Fonte: https://www.correioangolense.com/artigo/economia/epal-e-arrogante-como-os-monopolios