LIBERDADE DE IMPRENSA EM ANGOLA

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Ilídio Manuel | Jornalista
[Ponto prévio] O jornal «PAÍS», através do seu «grande repórter» André Mussamo, pediu-me que emitisse uma opinião, (mais ou extensa) sobre A Liberdade de Imprensa em Angola desde à chegada de JLo ao poder para que a mesma fosse inserida num trabalho a publicar por ocasião da data afim.
Enviei o artigo dentro do prazo combinado, mas, lamentavelmente, o mesmo não foi publicado. André Mussamo alegou que a sua não publicação ficou a dever-se ao facto de outras pessoas convidadas a pronunciarem-se sobre o mesmo assunto não terem honrado com as suas promessas. Para que o artigo não perdesse a actualidade, decide dar à estampa do mesmo neste meu quintal.

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Desde a chegada ao poder de João Lourenço, a comunicação social angolana, sobretudo a pública tem vindo a registar alguns avanços e recuos. Hoje, ao contrário do que se verificava num passado recente, nota-se uma certa abertura na abordagem dos temas antes tidos como «proibidos» ou tabus pela censura ou autocensura.

Há algum esforço na busca do contraditório, assim como em escutar outras vozes e sensibilidades políticas diferentes dos habituais círculos do poder ou dos seus apêndices.

Estes avanços, ainda que tímidos, fizeram com que Angola subisse quatro lugares no ranking da liberdade de imprensa mundial, de acordo com a mais recente avaliação da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF). O ganho embora modesto deve ser saudado e encorajado.

Apesar dessa ligeira subida, Angola continua, lamentavelmente, a ser o PIOR país em matéria de liberdade de imprensa nos PALOP´s.

Se é certo que Angola registou alguns avanços neste capítulo, não é menos verdade que do ponto jurídico-legal, o país confronta-se com um paradoxo, ou uma situação, no mínimo, caricata, a avaliar pela manutenção do pacote de Leis da Comunicação Social de cariz autocrático, que foi aprovado pela Assembleia Nacional em Janeiro do ano passado.

A legislação em causa, que visou proteger os interesses do partido que detém o poder, não só atenta contra à liberdade de imprensa e expressão, como também reapresenta um retrocesso nas conquistas já alcançadas. A nova Lei de Imprensa é defensora da prisão dos jornalistas quando deveria defender apenas a responsabilização cível. Ela confere, por exemplo, poderes quase discricionários ao Ministério da Comunicação Social que tem a prorrogativa de proceder à cassação das licenças aos mídia, aplicar pesadas multas aos jornalistas que podem chegar até aos 20 milhões de Kwanzas. O que antes era da esfera dos tribunais passou agora ao livre arbítrio do órgão de tutela.

Como se pode falar em promoção e defesa da liberdade de imprensa e expressão quando a lei exige para abertura de uma rádio a quantia de 250 milhões de Kwanzas? Indirectamente, o que a lei pretende é a negar o direito aos «sem voz», de forma a permitir que os endinheirados com ligações aos círculos do poder sejam os únicos a ter acesso às rádios.

Pessoalmente, sou contra a existência do Ministério da Comunicação Social, pois noutros países como, por exemplo, Cabo-Verde, Portugal e Brasil, não existem esses órgãos de tutela. Bastava para o efeito a criação de um órgão Regulador da Comunicação Social.

Se houvesse, de facto, uma vontade do MCS em mudar o quadro, este órgão já deveria ter tomado a iniciativa de submeter à Assembleia Nacional o pacote de leis para que sejam expurgados os artigos que agridem gravemente à liberdade de imprensa e colidem com a CRA.

Noto, com a alguma preocupação, nos últimos tempos uma certa tendência da imprensa pública em NÃO NOTICIAR certos acontecimentos politicamente incómodos para o poder, ou quando os noticia oculta ou deturpa deliberadamente a verdade. Isso é mau, pois transmite a ideia de que se pretende SUBSTITUIR A CENSURA e a autocensura do passado por uma nova, talvez mais refinada. A imprensa deve primar pela isenção, rigor e independência sem olhar a quem serve ou esteja no poder.

Fico, às vezes, com a sensação de que a mídia pública só divulga algumas notícias devido às pressões exercidas pelas redes sociais. Hoje, as hipóteses de ocultar os factos são cada vez mais diminutas, daí a necessidade dos órgãos de comunicação serem proactivos e não reactivos, sob pena de não terem outra saída senão correr permanentemente atrás do prejuízo. Infelizmente, nem tudo o que se divulga nas redes socais é verdade, mas é necessário saber separar o trigo do joio. Não se deve pura e simplesmente negar ou negligenciar as redes sociais com o argumento de que as mesmas só divulgam mentiras e a calúnias, há também verdades e isenção nesses espaços. Em boa verdade, as redes sociais só atingiram a importância e o impacto que têm por culpa do próprio poder político que sempre censurou a imprensa pública, ao ponto de desacreditá-la.

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