GILBERTO SIMÃO: “O PREÇO DO PÃO DEVERIA BAIXAR”

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Presidente da Associação de Industriais de Panificação e Pastelarias de Angola alerta para especulação e avisa que há concorrência desleal no sector.

Como estão as nossas indústrias panificadoras e pastelarias?

Neste momento, temos mais de mil padarias e pastelarias, de acordo com dados do Censo ao sector feito pelos ministérios do Comércio e da Indústria. A Associação conta com mais de 500 associados. Vivemos uma crise muito grande, porque mais de 80% do sector do pão está nas mãos de estrangeiros. Não gostamos muito de mencionar as nacionalidades, porque Angola é um país aberto e o mundo hoje é global, mas não aceitamos a concorrência desleal que trazem para o País.

Porquê?

Isto acontece por causa das fontes de abastecimento de matéria-prima. Com a liberalização da economia, o Governo escolheu meia dúzia de empresas para importar trigo. Apesar de essas empresas serem de direito angolano, a sua gestão é estrangeira. Os seus donos são governantes e altas patentes do País que, como não podem aparecer, contratam esses gestores expatriados. Estes, por seu turno, transformaram-se em produtores e importadores, e criaram redes retalhistas de venda dos produtos com os seus conterrâneos, o que acaba por ser um monopólio por causa da matéria-prima.

Qual a solução proposta pela associação?

Apresentámos um programa de criação de uma cooperativa dos industriais de panificação que iria estabilizar o mercado, importando para se autofinanciar e ganhar uma quota do sector, para mantê-lo equilibrado, porque a situação que se vive é de desequilíbrio e chega a ser um problema de segurança nacional. Enquanto o processo não avançar, vamos continuar a bater na mesma tecla para revertermos esse quadro, porque as cooperativas são empresas que devem ser parceiras do Estado. É um perigo continuar nesta situação em que a nossa economia está entregue aos estrangeiros. É preciso dar mais poder económico às nossas pequenas e médias empresas, porque os fundos existem, mas são sempre entregues a ‘espertalhões’ que abrem empresas sempre com estrangeiros.

Em termos de matéria-prima, tudo é importado?

A única matéria-prima que não é toda importada é o sal, porque há alguma produção nacional, que, ainda assim, também não satisfaz o mercado. E é também nossa tarefa, como associação, trabalhar com o Governo no sentido de que a matéria-prima seja produzida em Angola.

Como?

Por exemplo, temos um programa de recuperação da cultura de trigo e de revitalização das moageiras que faliram. Não se compreende como um país que já teve seis moageiras e produzia trigo, hoje, não tenha nada disso. Fui director de uma empresa que vendia sacaria de rafia aos produtores de trigo, e é triste, para mim, ver o País nesta situação. É hora de ressuscitar essas empresas para substituir importações. Temos contactado os produtores de trigo do antigamente, que só nos pedem sementes para a produção, e equipamento agrícola.

Há risco de o preço do trigo voltar a disparar?

Claro, há sempre. O trigo é uma commodity, e os preços variam no mercado internacional. Mas do que precisamos é de que a cooperativa da associação também possa importar trigo, porque garantiremos o produto no mercado a preços não especulativos, sempre estável, para evitar que apenas seis empresas importem. Se tivermos em conta que o pão tem mais percentagem de farinha de trigo face a outras matérias-primas, saberemos o quão estratégico é ter uma empresa nacional com industriais do sector importando trigo. Houve uma altura em que se comprava farinha de trigo a um preço muito especulativo, o saco chegou a custar 35 mil Kz, e nós, associação, em colaboração com o Entreposto Aduaneiro, conseguimos estabilizar o preço, dando uma lufada de ar fresco aos industriais de panificação. Actualmente, o saco de trigo está entre 6 mil Kz e 7 mil Kz, um preço que se ajusta, mais ou menos, ao câmbio flutuante do Banco Nacional de Angola.

O preço do pão, neste momento, é o ideal?

Hoje não, pensamos que deve merecer uma correcção, em baixa. Não se justifica o preço actual, porque o preço da farinha de trigo está estável. Mas a venda de pão tem de ser organizada e regulada, sem concorrência desleal. Não estamos de acordo com as condições em que é vendido o pão, nas ruas, em bacias e em carros de mão. Por isso, criámos um programa para melhorar a venda de pão, obrigando aos industriais a investirem na venda em depósitos fixos e móveis. Não queremos que as senhoras que vendem o pão percam o seu negócio, mas, sim, dignificar a actividade.

Fonte: Vanguarda (texto de Edjail dos Santos)

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