CAMPO DA MORTE: CASO N.º 42: BICHO MAU

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VÍTIMA: Sebastião Monteiro Viegas “Bicho Mau”, 25 anos, natural de Luanda; Léo Baba, Irmão do Toca-Lá; mais duas vítimas não identificadas.

DATA: 6 de Setembro de 2016

LOCAL: Primeira dos Carneiros, bairro 6 (Abega), uma rua depois do Campo da Morte

OCORRÊNCIA:

“Às cinco da manhã, mais de sete agentes fardados da Polícia Nacional vieram buscar-me a casa. Por não terem encontrado o Sebas, espancaram o irmão menor, Arnaldo Monteiro de Quintas, de 15 anos, com porretes, e levaram-no para a Esquadra dos Contentores [Estalagem]”, conta Teresa Monteiro.

Os agentes exigiram à mãe que os levasse até à residência de Sebas, no bairro Palanca, onde este vivia com a esposa.

“Pelo caminho, os agentes do SIC disseram-me: ‘Mamá, prepara o caixão. Hoje será o dia da morte do teu filho.’ Eu respondi: ‘Seja feita a vossa vontade”, revela Teresa Monteiro.

Já em casa do filho, os agentes dedicaram-se a esbofetear a sua nora na cara, diante dos filhos de cinco e três anos, que choravam. Obrigaram-na a telefonar ao marido pedindo-lhe que fosse ter consigo para uma emergência. Retiraram a fotografia do jovem da sala e foram emboscá-lo.

“Saí da casa do meu filho sozinha. Como não tinha dinheiro para o transporte de regresso a casa, fui pedir apoio a alguns familiares que viviam ali perto e avisá-los sobre o que ia acontecer”, recorda Teresa Monteiro.

“Às 7h30 ao chegar a minha casa, recebi a notícia de que o meu filho já tinha sido morto com quatro tiros. Dois na cabeça, um no peito e outro no abdómen”, afirma.

“Soube que ele e o amigo tinham sido apanhados no bairro da FTU, quando desciam do táxi, a caminho da sua casa. Trouxeram-nos até aqui, a cerca de 300 metros da minha casa, onde foram fuzilados.”

A foto de Bicho Mau, morto, com uma arma sobre o peito, e do amigo ao lado, tornou-se viral nas redes sociais. Algumas testemunhas entrevistadas afirmaram que, depois de o terem executado, um dos agentes colocou a arma no peito da vítima, para que assim fosse fotografada.

No patrulheiro que levou Teresa Monteiro à casa do seu filho, estavam dois jovens manietados por um único par de algemas. Tiveram o mesmo destino.

“Esses dois jovens, que não sei quem eram, também foram fuzilados aqui no meu bairro, noutra rua. Já não sei se foi pouco antes ou depois do meu filho e do seu amigo. Nesse mesmo dia, aqui nessa zona, as autoridades mataram mais de 15 jovens”, acrescenta.

Teresa Monteiro assume que o seu filho era delinquente. “Como mãe, nunca mandei o meu filho roubar. Se ele foi delinquente, vamos defendê-lo mais como? Tenho medo”, afirma.

Um mês antes, a 7 de Agosto, Teresa Monteiro foi visitada de manhã por cinco ou seis indivíduos que se identificaram como sendo operacionais do SIC. Disseram-lhe que nesse dia o filho tinha assaltado uma residência.

“Encontraram-me no quarto a vestir-me e pedi-lhes que esperassem. Disseram-me logo: ‘Vais morrer também.’ Esses indivíduos levaram a minha botija de gás. Um deles olhou para o meu televisor pequeno, muito antigo, e disse: ‘A mãe do gatuno tem esse televisor? Aqui não tem nada de jeito para levar”, recorda.

Depois, os homens conduziram Teresa Monteiro à casa assaltada. “Disseram-me que ele tinha assaltado dois televisores, telemóveis, uma botija de gás e não sei mais o quê. Giraram comigo de carro durante uma hora e depois decidiram levar-me à esquadra dos Contentores, na Estalagem.”

Segundo Teresa Monteiro, o oficial de serviço repreendeu os agentes, lembrando-lhes que o crime é intransmissível e que não tinham o direito de tirar a mãe de casa. Terá então encaminhado os agentes para uma cela.

“A polícia ligou para o meu filho, na minha presença, e ele confessou o crime por telefone. Ali mesmo, o oficial disse-me: ‘Mãe, prepara já o caixão para o teu filho”, revela.

Teresa Monteiro, corroborada por dois outros munícipes, descreve a onda de terror que tem varrido o município de Viana, e conta que os assassinos institucionais tem uma quota de alvos a abater, a qual divulgam junto de familiares das vítimas. “Aqui nessa zona, eles diziam que tinham marcado a morte de 250 jovens. Os grandes bandidos, aqueles que podem pagar pela sua liberdade, esses andam aí. Matam esses miúdos que roubam telemóveis, botijas de gás e muitos inocentes.”

 

Fonte: «O campo da morte – Relatório sobre execuções sumárias em Luanda, 2016/2017», Rafael Marques de Morais

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