Hariana Verás: Jornalista ou lobista – Rui Kandove

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A presença da jornalista angolana Hariana Verás como moderadora de uma comunicação presidencial no Global Africa Business Initiative (GABI), em Nova Iorque, reacende um debate urgente sobre os limites entre jornalismo, diplomacia pública e comunicação institucional. Mais do que uma escolha técnica, trata-se de uma decisão simbólica que desafia os princípios éticos que deveriam nortear a comunicação ao serviço da cidadania.

Hariana, nascida em Malanje em 1984, construiu uma carreira marcada por passagens pela TV Zimbo e TPA, antes de se consolidar nos Estados Unidos. Em 2023, tornou-se a primeira jornalista africana acreditada junto ao Pentágono e, em 2024, recebeu o Hard Pass da Casa Branca — credencial que garante acesso ao briefing diário da presidência americana. Esses marcos foram celebrados como conquistas de representação africana no espaço mediático internacional.

No entanto, em junho de 2025, o seu acesso à Sala Oval foi suspenso por alegada atuação como lobista — formulando perguntas que mais promoviam o governo angolano do que buscavam esclarecimento público. A medida, embora contestada por ela, foi interpretada como violação dos padrões internacionais de transparência. É precisamente esse modelo de atuação que agora se repete, com Hariana a moderar uma comunicação presidencial em solo americano.

A quem serve essa escolha?

Do ponto de vista do poder político, Hariana representa uma voz alinhada, previsível, capaz de conduzir narrativas sem fricções. Mas essa segurança tem um custo: o esvaziamento da crítica, a anestesia do debate, a transformação da comunicação pública em blindagem institucional. A opinião pública angolana, por sua vez, não vê nesta jornalista uma servidora do interesse coletivo. Sua atuação é frequentemente percebida como extensão da máquina de propaganda, e não como expressão de jornalismo livre.

A insistência em mantê-la como moderadora do presidente João Lourenço, mesmo após o episódio da Casa Branca, revela uma lógica de poder que prefere a fidelidade à verdade, o controlo à transparência. Ter viabilizado essa participação pode ser visto também como falha do sistema de segurança, considerando que a imagem e reputação do Chefe de Estado são, em última instância, questões de segurança nacional.

O que está em jogo?

• A credibilidade da comunicação institucional angolana.

• A possibilidade de reconstruir pontes entre o Estado e a sociedade, entre o poder e a verdade.

• O futuro de uma geração de comunicadores que precisa de referências éticas, não apenas funcionais.

• E, sobretudo, a imagem e a credibilidade do Presidente da República.

Este não é um episódio isolado. É sintoma de uma cultura política que resiste à renovação, que confunde lealdade com serviço público, que teme o contraditório e prefere o elogio à escuta. A imagem do Presidente não é apenas uma questão de perceção comunicacional — é também, e sobretudo, um fator de segurança. Ignorar essas nuances é desrespeitar o compromisso coletivo.

A comunicação pública deve ser um lugar de encontro, não de encenação.
Deve ser espaço de verdade, não de blindagem.
É tempo de renovar: de abrir espaço para vozes que honrem Angola com independência, rigor e serviço.
De transformar a dor de cabeça institucional em oportunidade de lucidez nacional.

Radio Angola

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