TANY NARCISO: O ADMINISTRADOR-CANTINEIRO – 2.ª SECÇÃO

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Nomeado Administrador do Município do Cazenga, pelo então Governador de Luanda, Job Castelo Capapinha, em principios de 2008, Victor Natanael de Oliveira Guilherme Narciso, mais conhecido por Tany Narciso (1), foi apresentado formalmente aos munícipes a 10 de Março do mesmo ano pelo então Vice-governador de Luanda para Área Técnica, Bento Soito, que disse:

O novo administrador vem numa missão específica e definida para responder e corresponder na resolução de acções que visam sobretudo solucionar os problemas básicos da população.

Os problemas da municipalidade são bem conhecidos e nesta nova etapa devem ser priorizados os que afligem a população.

Cazenga é um município cuja população é carente porque necessita de condições físicas e ambientais, neste contexto advogamos mais apoio e meios propícios que permitam a melhoria das condições de vida.

A nomeação do actual responsável vai criar junto da população expectativas no que concerne à melhoria dos problemas locais, mas tudo passa numa coordenação e governação participativa e dar prioridades aos (problemas) pontuais, como a recolha do lixo, sucatas e do saneamento básico. (Angop, 10 de Março de 2008, 17h35)

O então novo administrador disse na altura: «o mais importante nesta tarefa é trabalhar com a população e poder contar com a mão-de-obra local.»

Consumados 10 anos na Administração do Município do Cazenga, o desempenho de Tany Narciso pode ser resumido na expressão «administrador-cantineiro» (2). Ao longo dos seus 10 anos, Tany Narciso criou e pôs em funcionamento uma rede de negócios que, além de imorais e amorais, são ilegais e, por isso mesmo, devem ser alvo de tratamento adequado por parte das autoridades competentes.

A sua gestão municipal tem sido marcada pelo cabritismo puro e duro, pelo nepotismo, pelo tráfico de influências, pela corrupção, pelo esbulho e pela promoção da lumpenagem como mecanismo de alienação cívica dos munícipes. Tany Narciso tem praticado uma gestão danosa traduzida num imenso conjunto de actos nefários ao desenvolvimento económico, social e cultural do Município do Cazenga.

Cazenga continua praticamente estagnada no tempo e no espaço. Os charcos, os amontoados de lixo, o trágico estado das ruas e estradas, a falta de água, o estado de abandono de escolas e centros hospitalares, as obras públicas estagnadas e que se converteram em perigo à segurança dos munícipes, a ausência de infraestruturas de apoio ao desenvolvimento sociocultural de crianças e jovens e muitos outros problemas continuam a caracterizar o município 10 anos depois.

Analisemos o discurso feito na altura da sua apresentação formal aos munícipes do Cazenga:

«O novo administrador vem numa missão específica e definida para responder e corresponder na resolução de acções que visam sobretudo solucionar os problemas básicos da população.» (Bento Soito)

Em 10 anos de esquecível administração, Tany Narciso não respondeu e nem correspondeu aos grandes anseios dos munícipes do Cazenga, traduzidos nos seus muitos e graves problemas.

«Os problemas da municipalidade são bem conhecidos e nesta nova etapa devem ser priorizados os que afligem a população.» (Bento Soito).

Imagem nº 13: Caos no saneamento público do Cazenga | Fonte: Administração Municipal do Cazenga (Pagina do Facebook, 26/02/2018)

De facto, a abundante poeira, os charcos, valas e valetas, lagos e lagoas, as ruas e estradas degradadas, a falta de energia, a falta de água, rede sanitária precária, ausência de espaços de desenvolvimento cultural, obras públicas estagnadas e outros problemas amplamente conhecidos continuam a fazer a marca registada do município. Cazenga passou a ser sinónimo de tragédia social.

«Cazenga é um município cuja população é carente porque necessita de condições físicas e ambientais, neste contexto advogamos mais apoio e meios propícios que permitam a melhoria das condições de vida.» (Bento Soito).

Ao contrário disto, a mobilização de «mais apoio e meios» a favor do município não alterou a realidade de estrutural caos e apocalipse social. A maioria dos 1.500.000 munícipes vive em más condições de vida.

«A nomeação do actual responsável vai criar junto da população expectativas no que concerne à melhoria dos problemas locais, mas tudo passa numa coordenação e governação participativa e dar prioridades aos (problemas) pontuais, como a recolha do lixo, sucatas e do saneamento básico.» (Bento Soito).

Qualquer auscultação feita em qualquer um dos 24 bairros do município demonstrará que a gestão de Tany Narciso não tem sido caracterizada pela «coordenação e governação participativa» e, ao contrário de «dar prioridades
aos (problemas) pontuais, como a recolha do lixo, sucatas e do saneamento básico», a realidade vivida e sentida pelos munícipes é da presença de enormes quantidades de lixo, sucatas e ausência de saneamento na quase totalidade do território do município. As expectativas que apresentavam/projectavam Tany Narciso como o gestor que promoveria o desenvolvimento do Cazenga e a consequente melhoria da qualidade de vida da sua população deram lugar à frustração e à resignação.

«O mais importante nesta tarefa é trabalhar com a população e poder contar com a mão-de-obra local», disse Tany Narciso em Março de 2008. Hoje a realidade revela, porém, que a sua mais importante tarefa no Município do Cazenga é a rede de negócios ilegais que criou e instituiu, que lhe rende centenas de milhões de kwanzas por mês.

Das cantinas ao cemitério, Tany Narciso tem levado a cabo um extenso e intricado processo de enriquecimento ilícito comparável ao aos esquemas de actuação da máfia. Cazenga tem estado a saque, à mercê de um administrador-cantineiro (3).

 

Notas

  1. Para fins de brevidade e clareza, usaremos a forma abreviada do nome do administrador em todas as próximas referência do presente estudo.
  2. Tany Narciso é também jocosamente chamado de “O Administrador Micheiro” por causa da extensa e complexa rede de negócios que criou e estabeleceu em toda a extensão do Município do Cazenga, tirando dividendos, isto é, micha (dinheiro, rendimentos, a parte que cabe a um negociante etc.), conforme será descrito neste estudo.
  3. Um facto pertinente que tem marcado a longa e esquecível permanência de Tany Narciso no cargo de gestor principal do Município do Cazenga é a sua sobrevivência às sucessivas remodelações – exonerações e nomeações – feitas pelos governadores provinciais que passaram por Luanda. José Maria Ferraz chegou a assinar um decreto de exoneração de Tany Narciso em 2010, mas o mesmo foi bloqueado (anulado) pelo então Presidente da República José Eduardo dos Santos. Bento Sebastião Francisco Bento também tentou exonerar Tany Narciso, sem sucesso, pela mesma razão. De resto, tanto Graciano Domingos quanto Higino Lopes Carneiro foram governadores de Luanda e o deixaram de ser, respectivamente, sem terem “mexido” em Tany Narciso.

Fonte: «Os negócios ilegais de Tany Narciso», Nuno Álvaro Dala, 2018

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