Polícia angolana mata mais que o coronavírus?
Um agente de autoridade interpela um jovem no distrito de Kifangondo, em Luanda – Direitos de autor OSVALDO SILVA / AFP
Por DW
Desde o início do estado de emergência em Angola, em março, as autoridades já mataram cinco pessoas – mais do que a própria Covid-19. A polícia promete responsabilizar agentes implicados. ONG denuncia “excesso de zelo”.
Angola regista mais de 50 casos positivos de Covid-19, entre eles três óbitos. Desde o início do estado de emergência, a 27 de março, as forças da ordem e segurança já mataram cinco pessoas. Ou seja, mais do que a própria pandemia, como sublinhou já o “governo-sombra” da UNITA, o maior partido da oposição, que esta segunda-feira (18.05) condenou o uso excessivo e desproporcionado de força contra os cidadãos.
A associação cívica “Mãos Livres”, que tem monitorizado a ação da polícia durante o estado de emergência, não tem dúvidas de que tem havido “um excesso de zelo” por parte da corporação. “Ou seja, a ação protagonizada pela polícia nacional tem causado muitas mortes que têm sido superiores ao coronavírus, que é a pandemia da qual originou o estado de emergência”, afirma Salvador Freire, jurista e presidente da ONG.
A associação tem feito várias denúncias e mantido contacto com a polícia angolana, diz Salvador Freire. E a monitorização que está ser feita pela ONG vai resultar num relatório. “Vamos fazer um relatório anual depois do estado de emergência para reportarmos exactamente aquilo que aconteceu durante este estado de emergência no nosso país. O uso da força que a polícia tem empregue não tem tido ponderação”, sublinha.
Polícia reprova conduta de agentes
A polícia lamenta as mortes e reprova a conduta dos efetivos envolvidos em tais atos. Mas também diz que alguns cidadãos têm confrontado os agentes da ordem. Segundo Waldmar José, porta-voz da polícia angolana, nenhuma entidade superior emitiu “qualquer orientação para que se empregasse a força.”
“É um ato isolado e, no momento certo, a responsabilidade disciplinar e criminal chegará ao vosso conhecimento. Se por um lado, essa conduta é reprovável, também importa referir que da parte de alguns cidadãos algumas condutas que têm vindo a ser adotadas são reprováveis e motivam claramente o emprego do uso da força”, justificou.
O analista angolano Agostinho Sicatu concorda que há agentes exemplares. “De facto, há agentes da polícia que vão fazendo trabalho pedagógico conversando com os cidadãos, mesmo nas estradas conversando com automobilistas nos mercados formais ou informais conversando com os vendedores e clientes.”
Porém, o analista entende que os pronunciamentos do ministro do Interior de Angola, Eugénio Laborinho, que disse que a polícia não estaria nas ruas a “distribuir rebuçados e nem chocolates”, podem estar na orgem destes comportamentos.
“Precisa-se de uma polícia republicana, uma polícia que faça o trabalho de assegurar a ordem e a tranquilidade públicas e não de assassinos soltos. Mas isso não derivou dos polícias em si, é uma interpretção, se calhar extensiva dos pronunciamentos do ministro do interior”, argumenta,
por: Manuel Luamba (Luanda)