O DR. CARLOS SATURNINO NÃO ACUSOU, APENAS INFORMOU. E A ENGENHEIRA ISABEL DOS SANTOS NÃO É CRIMINOSA

Compartilhe

Um dos problemas que mais afectou a gestão do executivo de Eduardo dos Santos foi a não observância dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública.

Urbano Gaspar

A confusão entre poderes estruturais do Governo e poderes instrumentais da Administração Pública sempre foi uma dor de cabeça para os constitucionalistas angolanos. O certo é que esta matéria não é particularmente de direito constitucional, mas de Direito Público no geral; não basta ser constitucionalista, sociólogo ou politólogo, é necessário ser publicista.

Os poderes da administração não se confundem com os poderes estruturais do  governo. Os poderes estruturais do governo estudam-se no direito constitucional, já os poderes da administração pública estudam-se no direito administrativo.

Poderes da administração pública são ferramentas postas à disposição do administrador para que a Administração Pública possa se estruturar e alcançar o objectivo principal; a saber, o interesse público.

Estes poderes são poderes-deveres, ou seja, o administrador não tem a liberdade de escolha entre usar ou deixar de usar. Ele DEVE usar. O dever de publicitar os actos da  administração pública é um dever (poder) vinculado e não discricionário.

A obrigação de tornar público os actos praticados pela antiga gestão da empresa pública “Sonangol” é um poder vinculado que o administrador dispõe para a satisfação do interesse público.  A nova gestão da Sonangol, na pessoa do Dr. Carlos Saturnino,  tem a obrigação de tornar público os actos da administração da Sonangol, sob pena de incorrer no crime de responsabilidade do  agente publico omisso.

O exercício da função administrativa rege-se pelo princípio da transparência na gestão da coisa pública exigida pelos administrados. O princípio da transparência tem fundamento no artigo 2°, nº 1. da nossa constituição, passamos a citar: “A República de Angola é um Estado democrático e de direito que tem como fundamento a soberania popular, o primado na constituição e da lei, a separação de poderes e a interdependência de funções, a unidade nacional, o pluralismo de expressão e de organização política e a democracia representativa e participativa”.

Do artigo acima descrito, podemos extrair a seguinte apreciação: A transparência é um princípio fundamental e basilar da nossa democracia. Nesta mesma linha Hilário afirma: “O principio democrático enquanto fundamento do próprio Estado de Direito angolano, extraímos o ideal da participação do cidadão na vida pública”, Esteves Hilário in A Instituição das Autarquias Em Angola: Uma Análise dos Pressupostos Constitucionais.

Em Hilário podemos extrair a ideia segundo a qual o exercício do poder vinculado por parte da actual administração  da Sonangol, em publicitar os actos da nova gestão, introduz um novo paradigma em relação a observância dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública. E sobretudo o respeito pela vontade dos cidadãos na fiscalização dos actos do Executivo.

Para que a transparência administrativa se torna efectiva é necessário tornar público os actos praticados pelos seus agentes.

O Dr. Carlos Saturnino não fez mais do que o seu dever, tornar público os actos da administração da empresa pública (SONANGOL), com objectivo de restabelecer a confiança entre o Estado e a participação activa dos cidadãos na vida pública. Uma simples informação não pode constituir elemento de prova acusatória em sede de justiça. A ideia segundo a qual o Dr. Carlos Saturnino acusou é no mínimo vergonhosa. Existe uma diferença abismal entre prova e elemento de informação em direito processual penal.

Acusação é fruto de investigação criminal conduzida via de regra por uma autoridade policial. Já a prova é elemento de convicção produzida em contraditório ou postergado. E Fernando Gomes explica e muito bem: o elementos de informação tem como objectivo preliminar reunir indícios de autoria e prova material numa possível inicial acusação, “Fernando Gomes 2016”.

Observada a diferenciação, fica claro que a simples informação não tem como ser elemento material de prova de condenação. A engenheira Isabel dos Santos não é criminosa. O principio da presunção de inocência ainda existe no nosso ordenamento jurídico.

O Ministério Público é o garante da legalidade democrática (ver artigo 186°), e tem a obrigação de defender os interesses colectivos e difusos, ver a alinha d) do artigo 186°. Interesses colectivos e difusos pressupõe  uma categoria indeterminada.

O inquérito preliminar lançado pelo Ministério Público não tem como objectivo perseguir a antiga gestão da Sonangol nem muito menos a família do camarada Eduardo dos Santos. Ao contrário, é dever do Ministério Público salvaguardar os direitos, liberdades e garantias fundamentais como um todo. O direito ao bom nome e reputação, o direito à imagem do artigo 32° da nossa constituição, não apenas da engenheira Isabel dos Santos mas de toda sua equipa neste caso.

Dizer que um inquérito preliminar do Ministério Público em relação às informações do novo PCA da Sonangol vai inviabilizar investimento privado é a manifestação fática da incompatibilidade da profissão de intelectual e académico, para este tudo vale, para aquele a dimensão antológica não se deve extrapolar.

A acção do Ministério Público vai reforçar a confiança dos investidores estrangeiros em relação à funcionalidade dos órgãos de justiça do nosso país.

Dr. Saturnino não acusou, apenas cumpriu o seu dever de informar, e a engenheira Isabel Dos Santos não é criminosa. Deixemos o Ministério Público fazer o seu trabalho. Estamos a viver uma nova era, a era da vassalagem acabou.

Leave a Reply