ESQUADRÃO DA MORTE DISPARA EM ÓRGÃO GENITAL DE MENOR

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Com 15 anos de idade, José Mbala, mais conhecido por Zezinho, perdeu parte do seu corpo – precisamente o seu pénis -, e assim terá de enfrentar o futuro quando o seu presente está marcadamente conturbado.

Texto de Pedro Gonga

A acção ocorreu no primeiro dia deste ano, numa altura de festa para uns mas de execução sumária para outros. Agentes do Serviço de Investigação Criminal (SIC) chegaram à tarde no bairro Capalanca, em Viana, numa viatura de marca Suzuki, cor cinzenta e chapa de matrícula LD-43-27-GX com a clara missão de capturar e executar o alegado delinquente conhecido por Demuá.

Sem sucesso no Capalanca, moradores dizem que eles seguiram para o bairro vizinho Caop B. No curto trajecto que faziam “viram o menino Zezinho” e o chefe da operação terá ordenado aos colegas que “agarrassem e colocassem o menino na viatura”. Quem nos conta é Nazaré José, tia da vítima.

“Chamaram o meu sobrinho e disseram que era ele o criminoso que estavam a procurar. O meu sobrinho disse que ele era inocente, mas mesmo assim não queriam lhe ouvir e começaram a lhe bater ali no carro”, conta a tia.

O tiro sobre o órgão genital revela o grau de malvadez do famoso esquadrão da morte que tanto é negado mas é visto e conhecido nos bairros de Viana e Cacuaco, como bem demonstrou Rafael Marques de Morais no relatório «O campo da morte», cujos casos foram publicados todos pela Rádio Angola.

Mesmo baleado, os agentes continuaram a bater o adolescente, sempre dentro do carro em movimento.

Quando Zezinho mostrou resistência à agressão e negou várias vezes ser delinquente, o agente identificado nos arredores por Pepino premiu o gatilho e a bala atingiu o pénis. O tiro foi feito por trás e a bala rompeu o órgão genital pela frente.

A tia conta o que o sobrinho lhe transmitiu sobre o momento: “O menino implorou tanto para que não o fizessem nenhum mal porque ele era inocente, que ele não é bandido e que nunca roubou”.

Mas nem por isso acalmou os ânimos dos agentes. Mesmo baleado, os agentes continuaram a bater o adolescente, sempre dentro do carro em movimento. A viatura apenas parou perto de uma vala a céu aberto mesmo nas imediações do Capalanca.

De tantas ameaças de morte seguidas do tiro, Zezinho tinha a certeza do desfecho: execução sumária. Um aparelho gravador foi colocado defronte ao rapaz enquanto era obrigado a admitido chamar-se “Demuá” e ainda confessar que foi encontrado com arma de fogo quando foi capturado. Sem forças e com tanto medo, Zezinho só aceitava tudo o que era dito. Estava a ser gravado.

A informação da captura circulava pelo bairro e rapidamente chegou aos ouvidos da família. Sem hesitar, correram ao comando municipal da Polícia Nacional em Viana, localizado na Vila de Viana, onde exigiram com veemência explicações sobre o paradeiro de Zezinho.

“Disseram às enfermeiras que o meu sobrinho é delinquente e que se em 24 horas a família não aparecesse para que lhe aplicassem uma injecção e o levassem à morgue”

Depois de “tanta confusão que fizemos no comando”, diz a tia, “um agente dali decidiu ligar ao chefe da operação dizendo que o menino que levaram não era o mesmo que estava a ser procurado”. A ligação do colega do comando municipal desmobilizou os agentes em missão e imediatamente levaram Zezinho ao hospital Américo Boavida.

Mas Nazaré José adianta que os mesmos agentes deixaram uma recomendação às enfermeiras no hospital.

“Disseram às enfermeiras que o meu sobrinho é delinquente e que se em 24 horas a família não aparecesse para que lhe aplicassem uma injecção e o levassem à morgue”, conta.

Mas as enfermeiras não acataram a ordem em respeito e cumprimento ao juramento de Hipócrates. Zezinho ficou hospitalizado durante quase três meses, tendo sido libertado no dia 20 deste mês, dia em que falávamos com a tia. Sofreu várias cirurgias. Debilitado fisicamente, Zezinho apenas conseguiu algumas palavras.

“Sinto muitas dores no pénis e na bexiga depois dessa última operação. Ainda hoje voltamos ao hospital, onde me trocaram as ‘argalhas’ e os sacos da urina”, lamenta o adolescente. O referido saco está ligado por dois tubos.

Nazaré faz a vez da mãe, pois esta não aguentou o choque da notícia e foi hospitalizada no hospital do Capalanca por ter sofrido uma hemorragia grave. A tia acrescenta que teme pela vida por ser o rosto da família na exigência por justiça. O agente Pepino continua em liberdade e circula descontraidamente pelo bairro.

“Ainda no mesmo dia que saímos do comando nos cruzamos no mesmo autocarro que fazia a rota do Capalanga”, diz, e acrescenta que “não se impliquei com ele porque os agentes disseram que quando o víssemos em qualquer lugar para não lhe dirigirmos qualquer palavra”.

À sexta-feira, dia 23, Nazaré José foi notificada pelo comando municipal. Os agentes que encontraram na unidade policial do Grafanil apenas ordenaram a senhora a comparecer novamente ali à sexta-feira seguinte, como se tivesse sob termo de identidade e residência.

“O que nos preocupa mais é o facto do mesmo senhor que fez o disparo não estar ainda na cadeia. Continua solto e passeia normalmente aqui no bairro, como se nada tivesse acontecido, ninguém diz nada. Afinal a justiça anda aonde nesse país”, questiona.

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