Cresce a crítica à politização dos sobas no Cuando Cubango
A população do Cuando Cubango critica a crescente politização dos sobas, acusando-os de perder neutralidade e autonomia. Analistas alertam que a dependência do poder político ameaça a legitimidade do poder tradicional.
Não é possível determinar com exatidão quantos líderes tradicionais existem em Angola, uma vez que os registos não são divulgados. Na província do Cuando Cubango, que conta com mais de 800 sobas, crescem as críticas sobre a “partidarização” destes líderes das comunidades.
À DW, o professor Albertino Cambinda André diz que os líderes tradicionais deixaram de ser apartidários.
“De facto, todos os sobas foram capturados pelo partido. Nós observamos sobas com bandeiras. Quando entras em casa dele, em vez de ter a bandeira da república, no pátio, tem a bandeira do partido. Lá dentro há bandeiras, chapéus, camisolas”, refere.
Também em declarações à DW, o académico Celestino Adriano sublinha que, desde a independência, o Estado angolano tem tentado domesticar o poder tradicional.
“Primeiro integrando, depois subordinando-o. Foram criados sobas, nomeados, em vez de os legitimar pela comunidade, em vez de seguir o sangue. [Existem] estruturas de dependência económica e sistemas de controlo político eleitoral, incentivos materiais que criam fidelidade ao partido e não ao povo”, critica.
Albertino André acrescenta que os sobas são ameaçados quando não se apresentam em atos de partidos que sustentam o Governo.
“São ameaçados. Em nenhuma parte do mundo eu ouvi que o soba pertence ao partido A ou B, mas aqui em Angola, inclusive os reis, pertencem aos partidos. Se ele não for ao partido [que sustenta o Governo] é porque é da oposição. O soba [deve ser] neutro, é pai de todos, são filhos”, considera.
Numa recente entrevista à Rádio Ecclesia, o soberano Manuel Ndala “Mwene Vunongue 8º”, lamentou o baixo valor do subsídio que é atribuído aos soberanos. Segundo ele, quando reivindicam aumentos junto do Governo, a justificação é que existem muitos sobas. “Quando tentamos reclamar, a resposta é que há muitas autoridades tradicionais, como quem diz que é um exército”, opina.

Para o analista Celestino Adriano, este subsídio, na ordem dos 24 euros, devia ser repensado. “Os sobas deveriam sobreviver daquelas gratificações que a população traz quando os visita ou quando eles resolvem conflitos. Quando uma autoridade tradicional passa a depender do poder político para sobreviver deixa de representar o povo e passa a representar quem lhe paga, está é a crise central”, refere.
“Se continuarmos neste caminho, corremos dois perigos: perdermos a essência do poder tradicional, transformando-o num departamento político, e perdemos a confiança do povo. Quando isto acontece, o soba deixa de ser autoridade e passa a ser figurante. Num país onde se está cada vez mais distante do cidadão, enfraquecer o poder tradicional é cavar um buraco ainda maior entre o Governo e o povo”, conclui.
DW-África

