CASO N.º 47: DA ESQUADRA DOS CONTENTORES PARA O CAMPO DA MORTE

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VÍTIMAS: Marcolino Hossi “Litana”, 22 anos; mais dois jovens não identificados

DATA: 5 de Maio de 2016

LOCAL: Campo da Morte, bairro 6, município de Viana.

OCORRÊNCIA:

Litana, também conhecido por “Todas as Tias”, pela popularidade de que gozava entre as mães da sua área de residência, tinha um historial de delinquência, como conta o seu primo Pedro Sabino Fito.

Dias antes do fatídico acontecimento, Litana e alguns amigos assaltaram um vizinho, efectivo das Forças Armadas Angolanas, e roubaram-lhe o telemóvel. A vizinhança identificou-o.

“Apanharam-no, deram-lhe uma surra ali mesmo no bairro e levaram-no para a Esquadra dos Contentores (na Estalagem). Foi a partir dessa esquadra que o levaram directamente para o Campo da Morte”, narra o primo.

Por volta das 9h00, dois agentes de campo, com coletes bem identificados do SIC, e um indivíduo à paisana dirigiram-se ao campo num Toyota Land-Cruiser de cor branca, vidros fumados e sem matrícula.

Da viatura, retiraram três jovens, incluindo o Marcolino Hossi “Litana”, de 26 anos. Pedro Fito, que testemunhou o fuzilamento, conta que os agentes obrigaram os jovens a dar alguns passos para frente sem olharem para trás.

“O Litana recusou-se e disse que podiam matá-lo assim mesmo, de frente”, realça a testemunha. “O primeiro, ao tentar dar um passo, apanhou um tiro nas costas e outro na nuca, que lhe atravessou o olho. O Litana levou um tiro nas costas e outro na cabeça.” O terceiro também foi assassinado com um tiro na cabeça.

Segundo depoimentos de C.F., na altura dos fuzilamentos “decorria um jogo de futebol no campo e havia muitas crianças a assistir, que acabaram também por presenciar as execuções”.

“Muitos [transeuntes e residentes locais] vieram aplaudir a acção do SIC, dizendo ‘bem feito’, porque os jovens atormentavam a população e a polícia estava a fazer um bom trabalho”, denuncia Pedro Fito. “A população pisoteou os corpos dos malogrados. Outros diziam que [os mortos] estavam a ressuscitar e atiravam-lhes areia.”

“Apesar de o meu primo ter sido um delinquente, a forma desumana como a população celebrou a sua morte e a dos outros jovens é muito triste”, conclui.

 

Fonte: «O campo da morte – Relatório sobre execuções sumárias em Luanda, 2016/2017», Rafael Marques de Morais