CARTA ABERTA AO PRESIDENTE JOÃO LOURENÇO SOBRE MASSACRE NO MONTE SUMI
À
S. Ex.ª Presidente da República
Sr. João Manuel Gonçalves Lourenço
CARTA ABERTA
Assunto: Pedido de Reapreciação do caso Kalupeteka
Vimos por este meio apelar à S. Ex.ª Presidente da República, Sr. João Manuel Gonçalves Lourenço, para, na qualidade de Chefe de Estado com responsabilidade constitucional sobre o Procurador-Geral da República (arts. 119.º, al. i e 189.º, n.º 4 da CRA), e a quem a PGR deve prestar informações nos termos da Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República e do Ministério Público (Lei n.º 22/12, de 14 de Agosto, art. 2.º, al. p), proponha à PGR a reapreciação do processo em que envolve o pastor José Julino Kalupeteka e fiéis da Igreja Adventista do Sétimo Dia A Luz do Mundo, uma vez que o recurso repousa há cerca de três anos no Tribunal Supremo, e porque em primeira instância há sinais de não terem sido escrupulosamente observados os princípios fundamentais do Código de Processo Penal.
S. Ex.ª Sr. Presidente da República, endereçamos a presente missiva depois de termos enviado cartas com igual teor ao Tribunal Supremo e Ministério da Justiça e Direitos Humanos, entretanto sem obtivermos quaisquer respostas.
Num artigo intitulado «Analistas condenam sentença de Kalupeteka», edição da Voz da América – Português, especialistas em Direito, como o jurista Adilson Salvador, alegam que «a moldura penal aplicada ao líder da seita “Luz do mundo” tem respaldo legal, mas chama atenção para a hierarquia penal, previsto no artigo 55º Código Penal Angolano. O mínimo a obedecer, de acordo ao artigo 93º, número 2, a pena não pode ser inferior a um mês e o máximo é de 24 anos. Não mais que isto».
Adilson Salvador adianta ainda que o juiz da causa qualificou os réus como sendo delinquentes habituais e por tendência. Esta qualificação não se adequa a José Kalupeteka e seus pares.
«Para a questão dos delinquentes por tendência é que deve haver um crime doloso a que corresponde a pena maior e que o seu comportamento revele malvadez, perversão e que faça considerar estes réus gravemente perigosos», enfatiza.
Para o sociólogo Carlos Conceição, citado no mesmo artigo, «a sentença peca por não ter sido chamado a prestar declarações no tribunal o órgão do Estado que tutela a legalização das Igrejas».
O Maka Angola, no seu artigo de 21 de Abril de 2016 – «Diário de um Sobrevivente do Massacre do Monte Sumi» – descreve assim o trágico acidente: «Raul Xavier, de 25 anos, foi dos primeiros a acorrer em socorro do seu líder, José Julino Kalupeteka, a 16 de Abril de 2015. Escondido no tecto da casa de Kalupeteka, acabou por testemunhar o massacre do Monte Sumi, sendo atingido com um tiro que lhe trespassou o tornozelo direito». Porquê os testemunhos de Raul Xavier não foram tidos em conta na decisão final do julgamento?
A Deutsche Welle, na sua publicação de 4 de Março de 2018, intitulada «Angola: Kalupeteka espera há dois anos por resposta do Supremo», noticia o seguinte: «A 5 de Abril de 2016, José Julino Kalupeteka, líder da seita “A Luz do Mundo”, foi considerado culpado do homicídio de nove agentes da Polícia Nacional».
Num dos julgamentos mais mediáticos e polémicos em Angola, o Tribunal Provincial do Huambo condenou-o a 28 anos de prisão. A defesa recorreu da decisão, mas passado quase três anos o Tribunal Supremo ainda não se pronunciou. Zola Bambi, um dos advogados de defesa de Kalupeteka, considera este silêncio incomum, mas não estranha, pois diz ser mais um exemplo da forma parcial como o julgamento foi conduzido.
Os actos processuais do Tribunal Provincial do Huambo aplicados aos crentes da Igreja Adventista do Sétimo Dia A Luz do Mundo suscitam sérias dúvidas em relação à imparcialidade das autoridades judiciais.
Em prol da liberdade de religião, de consciência e da liberdade de expressão, a nossa sociedade tem a obrigação moral e cívica de questionar os moldes jurídicos aplicados neste julgamento.
Subscrevemo-nos com a mais elevada consideração.
Luanda, 27 de Maio de 2019
Sedrick de Carvalho
Country Director
Friends of Angola
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