CAMPO DA MORTE: CASO N.º 5: CERCADOS

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VÍTIMAS: Moisés Ângelo Fernando “Picatchu”, 22 anos, natural de Luanda; Eduardo Chilombo “Edu”, 21 anos, natural do Kwanza-Sul; Chilala (não foi possível obter mais informações sobre o jovem)

DATA: 15 de Abril de 2017

LOCAL: bairro Ngola Kiluange, município de Cacuaco

OCORRÊNCIA:

Na noite de 14 de Abril, três amigos tomavam bebidas alcoólicas na rua quando se envolveram numa altercação entre si.

“Uns indivíduos do SIC estavam a passar e perguntaram [a algumas testemunhas oculares da briga] se os jovens eram delinquentes”, conta uma das testemunhas, sob anonimato.

Perto das seis da manhã, de regresso a casa, os rapazes foram cercados na zona do Colégio Jeremias, junto à residência de Moisés.

De acordo com os depoimentos recolhidos no local, Chilala foi o primeiro a ser morto com quatro tiros na região abdominal. Picatchu fugiu para a casa de uma vizinha, em cuja varanda foi crivado de balas: sete tiros no peito e um no pé. Morreu ali mesmo.

Picatchu tinha cadastro criminal. Em 2013, fora detido por ter roubado 25 pares de chinelas de plástico e 50 mil kwanzas, permanecendo no cárcere por três anos. Pouco depois da sua libertação, em 2016, em mês não preciso, o jovem foi de novo parar à cadeia, desta vez por seis meses, por suspeita de furto de telemóvel.

A irmã mais velha de Picatchu, Júlia, afirma que, durante a detenção pelo furto do telemóvel, ele e os seus amigos haviam sido apanhados com uma arma na mochila.

“Nós [família] pagámos cem mil kwanzas aos investigadores do SIC, no Comando Municipal de Cacuaco, por insistência da minha mãe, que queria o filho em liberdade. E ele foi libertado”, revela Júlia.

À data da sua morte, Picatchu encontrava-se em liberdade havia apenas um mês. “O que esse tipo de pessoas espera? Dói-nos, como família. Como mais velhos, vimos o bem e o mal, e aconselhámo-lo a seguir o caminho do bem, mas ele não ouvia, queria cometer. Era drogado e faltava ao respeito à família”, lamenta a irmã.

“Não posso defendê-lo. Não tenho como. Senti uma dor de leve, mas não esperava outra coisa. Os vizinhos informaram-nos de que foi a DNIC [SIC] quem os matou. Eu não vi, porque estava a dormir. Soube também que, quando estavam a lutar à noite, os homens da DNIC passaram e perguntaram sobre o que se estava a passar”, conclui.

 

Fonte: «O campo da morte – Relatório sobre execuções sumárias em Luanda, 2016/2017», Rafael Marques de Morais