Um pesadelo presidencial chamado “500 000 empregos”

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Devo, aprioristicamente, apontar que o maior desafio político-social do Presidente João Lourenço reside no conjunto de problemas económicos que afectam o País, ou seja, o problema económico. Este é também o maior problema da generalidade dos Angolanos.

Por: Nuno Álvaro Dala

A vida económica (ou socioeconómica) dos cidadãos tem estado a piorar no últimos anos, à proporção da hecatómbica desaceleração da economia nacional. Notemos o seguinte: em 2014 (ano do início da crise), a taxa de crescimento (TC) da economia angolana foi de 4,2%; em 2015, a TC da economia foi de 4%; em 2016, a TC da economia foi de 3,3%; em 2017, a TC da economia foi de 2,7%. Em 2018, a TC da economia foi de 1,1%. Em linguagem simples, quer dizer que a economia angolana tem estado em queda livre. Dito ainda de outro modo, significa que os níveis de crescimento de produção da riqueza nacional têm caído vertiginosamente desde 2014, aproximando-se da taxa zero.

A realidade de uma economia em queda livre ou depressão nota-se no aumento dramático da inflação, do custo de vida, da fome, enfim da pobreza e da miséria no seio da população.

Diante das condições socioeconómicas difíceis, não há poesia política presidencial que sobreviva.

O desgaste dos cidadãos é tão grande, que grandes franjas da sociedade sentem “saudades do [tempo do] Zé Dú”. “Ele roubava, mas havia dinheiro no país”, disse-me um grupo de vendedoras do Lobito. “No tempo do Zé Dú, o saco de arroz, o saco de feijão, o saco de fuba, o peixe, a carne e outros produtos eram baratos; nós comprávamos à vontade. Hoje somos obrigadas a fazer sociedade para comprar uma caixa de frango ou de arroz. Está mal”, disse-me um grupo de vendedoras do Kuito. “Meu filho, não sabemos o que esse Lourenço quer connosco. No tempo do outro não éramos ricos, mas a vida não era difícil como agora”, disse-me uma senhora de idade, em Saurimo.

O problema económico com que se confronta João Lourenço possui uma variável que representa um pesadelo para ele enquanto Presidente da República: os 500 000 empregos que prometeu durante a sua flamejante campanha eleitoral.

Acontece que, além da inflação galopante e das medidas fiscais draconianas que têm sido implementadas pelo seu governo, o Presidente da República tem estado – ele próprio – a notar o aumento astronómico do desemprego, fruto do número elevado de empresas que fecham as portas todos os dias.

Quando assumiu a chefia do Estado e do Governo, João Lourenço também assumiu a complicada tarefa de reestruturar e revitalizar a economia e, ao mesmo tempo, criar 500 000 empregos.

Cumprir com a promessa dos 500 000 empregos é um desafio que se revela um grande pesadelo.

Para concretizar com sucesso tal desafio, João Lourenço – através do seu governo – teria de criar 100 000 empregos por ano, de modo que até Setembro de 2022, o objectivo estaria cumprido.

Ora, em termos mais concretos, a esta altura (Outubro de 2019), já teriam sido criados cerca de 200 000 empregos. Neste caso, 100 000, seriam criados em 2020, outros 100 000 em 2021 e, finalmente, os últimos 100 000 em 2022.

Como se pode ver, em 2 anos, o Governo do Presidente João Lourenço nem sequer conseguiu criar 50 000 empregos, ou seja, nem sequer 10% do total.

Por outro lado, mesmo que João Lourenço arbitrariamente deliberasse que os 500 000 empregos serão criados em 2 mandatos (10 anos no total), cumprir com a referida promessa ainda seria um pesadelo político-social. Ele – através do seu Governo – teria de criar 250 000 empregos no período 2017-2022 e 250 000 empregos no período 2022-2027.

A economia angolana continuará em estado crítico nos próximos 3 anos ou mais (segundo diversas projecções). Quanto ao investimento externo, os investidores continuam geralmente reticentes por causa do mau clima de negócios do País, que é dos piores do mundo. Afinal, as máfias – que mantêm a economia sequestrada há décadas – ainda continuam. Ademais, enquanto figuras tóxicas continuarem a exercer funções no Governo, americanos e europeus não vão abrir os cordões à bolsa. Os dólares continuarão bloqueados e o investimento externo continuará a ser uma miragem. Não é à toa que João Lourenço tenha exigido que o Presidente do Tribunal Supremo, Rui Ferreira, pedisse demissão. Ele, que está envolvido numa teia complicada em que cruzam Arosfram, Hezzbolah e outros maus negócios, saiu por manifesta pressão dos Estados Unidos, país que reage energicamente contra quaisquer pessoas directa ou indirectamente ligadas a grupos terroristas.

Como se vê, realizar o objectivo de 500 000 empregos (no presente mandato apenas ou/e no segundo, caso seja reeleito) é um grande pesadelo para João Lourenço enquanto Presidente da República.

Não é possível ao Presidente da República fingir que o pesadelo dos 500 000 empregos não existe.

Na verdade, os grupos de pressão de sempre têm realizado frequentes protestos de rua, nos quais os cidadãos manifestantes têm feito questão de fazer lembrar ao Presidente que ele deve cumprir com a promessa, ao passo que exigem medidas do seu governo para que os 500 000 empregos sejam uma realidade.

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