Conferência de Imprensa do Grupo Parlamentar da UNITA Relativamente a Brutalidade Policial e as Detenções Arbitrárias em Cabinda
REPÚBLICA DE ANGOLA
A S S E M B L E I A N A C I O N A L
GRUPO PARLAMENTAR
GABINETE DO PRESIDENTE
CONFERÊNCIA DE IMPRENSA
VISITA DE CONSTACTAÇÃO SOBRE O ESTADO DOS DIREITOS E LIBERDADES EM CABINDA
O Grupo Parlamentar da UNITA, respondendo à solicitação de inúmeros cidadãos, realizou nos dias 01 e 02 de Março do corrente ano, uma visita de constatação relativa aos Direitos, às Liberdades e garantias dos cidadãos em Cabinda, muito em especial para fazer um levantamento sobre as detenções que envolvem um elevado número de jovens naquela parcela do território.
A Delegação do Grupo Parlamentar da UNITA foi composta pelos Deputados, Joaquim Nafoia, como Coordenador, RaúlTaty e pelo Assessor Jurídico, Pedro Kangombe, tendo solicitado vários encontros, ao senhor Governador da Província (que não respondeu), ao Sub-Procurador da República (que marcou para posterior data), à Delegação do Interior e Comando Provincial da Polícia Nacional, bem como visita às unidades penitenciárias da Cadeia Civil e do Yabe, que tiveram lugar.
A delegação foi recebida pelo Delegado do Interior e Comandante Provincial da Polícia Nacional, Comissário Eusébio da Costa, acompanhado pelos dois (2) Comandantes, o Assessor jurídico, o Director Provincial do SIC e pelo Director de Informação e Análise do Comando Provincial.
Explicados os motivos da visita, a delegação do Grupo Parlamentar da UNITA ouviu dos anfitriões a sua versão sobre o que se estava a passar em Cabinda.
O Comandante confirmou a detenção de 63 cidadãos com ligações ao Movimento Independentista de Cabinda, por pretenderem fazer uma marcha alusiva ao dia 1 de Fevereiro, data que se comemora o Tratado de Simulambuco. Alegou ter recebido da PGR mandados de busca e apreensão que os levou a encetar acções que resultaram na aquisição de provas bastantes para a legalização das detenções efectuadas, negando ter a Polícia Nacional realizado detenções arbitrárias.
A delegação visitou os reclusos da Cadeia Civil, onde foi recebida por volta das 15.00 horas pelo Director Provincial dos Serviços Penitenciários acompanhado pelo Director da Unidade Penitenciária.
Seguiu-se o encontro no pátio da área penal onde a delegação interagiu directamente com os cidadãos presos, tendo os mesmo referido terem sido brutalmente espancados, depois enviados para a esquadra municipal e dali, transferidos para o SIC Provincial. Entretanto, no mesmo dia e por solidariedade, outros 30 cidadãos marcharam até a sede do SIC, tendo sido, também, detidos.
Encontro particular com a reclusa Maria Mambo Deca
As três senhoras detidas foram encaminhadas para a unidade penitenciária do Yabi por falta de condições apropriadas para a população prisional feminina na cadeia civil de Cabinda. Assim sendo, não tendo sido possível contactá-la juntamente com o grupo, foi reservado um encontro particular no sábado de manhã com a colaboração dos serviços prisionais que a transportaram da cadeia do Yabi à cadeia civil de Cabinda. Durante o encontro a delegação teve o ensejo de interagir com a senhora Maria Deca, formada em psicologia e antiga técnica de engenharia de perfuração do campo petrolífero,sujeita a uma sessão de tortura física que a deixou com o rosto inchado e com dores fortes nas costelas.
Estava indiciada por crimes de associação criminosa, perjúrio contra o Estado, rebelião e resistência. No final, a delegação manifestou junto das autoridades policiais, uma profunda tristeza pelo relato ouvido e deixou uma palavra de alento para a referida cidadã.
Agressão policial contra os organizadores da vigília
No sábado de manhã, a delegação recebeu ainda um grupo de onze activistas que se juntaram no Largo 1º de Maio, no dia 01 de Março, para uma vigília programada para as 18:00 em solidariedade aos presos do MIC. Segundo os seus relatos, a Polícia apareceu no local antes do início do acto, e agrediu brutalmente os activistas com pontapés, socos, bofetadas e golpes de coronhadas, tendo sido posteriormente recolhidos e conduzidos para a esquadra municipal donde foram transferidos para o SIC por volta das 20:00 e postos em liberdade por volta das 23:00.
Conclusões:
Diante destas constatações, entendemos que a onda de detenções ora despoletada carece de uma contextualização. Cabinda continua a ser uma das Províncias de Angola onde se regista um movimento reivindicativo de carácter independentista que ao longo dos anos foi ganhando várias expressões de carácter político, militar e cívico, o que traz à ribalta a ineficácia da estratégia concebida e aplicada pelo regime angolano.
Essa estratégia tem tido três vertentes: a vertente militar, a vertente repressiva e a sócio-económica. Em relação à estratégia militar, depois do Memorando do Luena que veio trazer a paz das armas ao País, urge privilegiar o dialogo permanente como de solução dos diferendos existentes.
Em relação à vertente repressiva,constactou-se que desde a extinção por via judicial da Associação cívica “Mpalabanda”, em 2006, o Executivo angolano através dos Órgãos de Defesa e Segurança tem situado a sua intervenção na restrição aos direitos constitucionais, mormente na proibição das reuniões, na proibição da liberdade de associação, na restrição à liberdade de expressão e de manifestação.Ora esta estratégia acaba por acentuar efeitos perversos, promovendo acções radicais em sentido inverso.
Na vertente sócio-económicaconstactou-se que a partilha de 10% das receitas fiscais, do valor da produção petrolífera, para investimentos em Cabinda, não foi cumprida. A título de exemplo os muito anunciados projectos do Porto de Caio, o Polo Industrial do Fútila, e a Centralidade não passaram do marketing publicitário; o Campus Universitário, o novo aeroporto e o terminal marítimo, iniciados, encontram-se totalmente paralisados. Estes factos também não se conjugam para a credibilidade das políticas anunciadas pelo regime angolano. Muito menos pelo cumprimento dos programas de investimento públicos aprovados na Assembleia Nacional.
Grupo Parlamentar da UNITA não pode aceitar que em tempos da construção do Estado democrático de Direito, os cidadãos na Província de Cabinda sejam tratados de forma arbitrária e autoritária;
O Grupo Parlamentar da UNITA depois de avaliar o papel das partes intervenientes, concluiu que as detenções foram arbitrárias e por isso, contrárias ao estipulado na Constituição e na lei;
O Grupo Parlamentar da UNITA já não pode aceitar que em tempos de paz morram angolanos em Cabinda vítimas de um conflito mal resolvido;
Assim, o Grupo Parlamentar da UNITA recomenda:
1. A criação de espaços de diálogo franco, aberto e transparente com os cidadãos e sobretudo com os jovens;
2. A necessidade da humanização dos Órgãos de Defesa e Segurança, que através de métodos repressivos e de violência estimulam e acirram os extremismos desnecessários;
3. A materialização e recuperação dos projectos económicos, com repercussão sobre a situação social das populações e sobre o elevado desemprego, que atinge especialmente os mais jovens;
4. Às autoridades do Estado angolano, a necessidade de se colocar a pessoa humana e a sua dignidade acima das instituições, pois estas só têm um papel instrumental na prossecução do bem comum e da organização da sociedade.
Luanda, 11 de Março de 2019.
O Grupo Parlamentar da UNITA